segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Além da obra-prima

Sérgio Magalhães
*Artigo publicado originalmente no jornal O Globo de 17/12/11
Acabada a Segunda Guerra, a Europa começando sua reconstrução, surge no cenário da cultura arquitetônica mundial uma nova expressão moderna, com obras produzidas por jovens arquitetos de um país distante, o Brasil. Entre elas, o edifício do Ministério de Educação e Saúde, hoje Palácio Capanema, no Centro do Rio, projetado em 1936. A equipe de Lucio Costa e dos recém-formados Jorge Moreira, Afonso Reidy, Ernani Vasconcelos, Carlos Leão e Oscar Niemeyer teve orientação inicial do mestre de todos, o franco-suíço Le Corbusier. O edifício, pelas inovações e qualidade geral, tornou-se um ícone da arquitetura mundial. É uma obra-prima.

Niemeyer se destacaria, também, na década de 1940, com os projetos para o bairro da Pampulha, em Belo Horizonte, encomendados por Juscelino Kubitschek, jovem prefeito, iniciando-se a parceria que a ambos consagraria. São pequenas obras-primas as que compõem o acervo da Pampulha.
A seguir, no Rio, projetos como o conjunto do Pedregulho, de autoria de Reidy, e os edifícios do Parque Guinle, de Lucio Costa, preparariam o caminho para a internacionalização da arquitetura brasileira em Brasília, em especial nos palácios desenhados por Niemeyer.
Aldo Rossi, o grande pensador e arquiteto italiano, para simplificar, distinguia as obras excepcionais e as obras comuns. As primeiras, com responsabilidade de permanência; as outras, compondo um quadro difuso,porém importante para a memória individual, embora sem igual transcendência e significado.
Mas o advento das novas tecnologias, concreto, aço, elevador, mudou a escala das edificações e a relação destas com o espaço público. E o que era difuso passa a conformar a cidade.
No caso brasileiro, a avalanche do processo de urbanização transformou o cenário. Da reflexão passou a exigir a emergência, da qualidade também a quantidade. A complexidade da vida de hoje, a variedade de exigências programáticas e funcionais,tanto dos edifícios quanto do urbano, tornou o ofício do projeto e da construção amplo e múltiplo.
Certamente, há encantamento na atuação de arquitetos em busca da obra-prima. Ela tem responsabilidade estética essencial à vida urbana. Não obstante, a profissão de arquiteto disseminou-se pelo tecido social em outras buscas, e, das poucas dezenas na primeira metade do século XX, chega-se, hoje, a mais de cem mil arquitetos em todo o país.
Arquitetos atuam em obras excepcionais e também em obras comuns; em interiores de residências e de empresas; monumentos, cidades e trechos de cidades; na paisagem e no território;no projeto, na construção, no planejamento, no serviço público, em escritórios,em empresas, autonomamente; enfim, a profissão do arquiteto é um universo com o objetivo da produção do espaço com qualidade.
É esse o entendimento da sociedade quando ouve os arquitetos a propósito do que se faz na cidade, sobre os espaços e edifícios, na promoção da beleza e da cultura. A sociedade confere ao arquiteto esse papel e espera que o cumpra em benefício do conjunto social.
Mas, apesar desse escopo complexo e rico, no Brasil, desde 1933, a arquitetura se encontra regulada junto com outras atividades correlacionadas, mas distintas, localizadas no campo da engenharia — e teve seus parâmetros profissionais até certo ponto subestimados. Não é o que ocorre em países como a França, a Espanha, os Estados Unidos, onde o arquiteto é responsável tanto pelo projeto como pela direção da construção,dos edifícios e do urbano.
Agora, a 15 de dezembro, conforme lei sancionada há um ano pelo presidente Lula, começou a implantação do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU), autarquia encarregada de regulara profissão em defesa da sociedade.Deseja-se que o faça em limites mínimos da burocracia e sem corporativismo.Para os arquitetos, será a alforria profissional. Para a sociedade, esperamos que seja um quadro de melhores perspectivas na construção e preservação de nossas cidades e dos ambientes onde vivemos.
É significativo que a data tenha coincidido com o 104o- aniversário denosso mais profícuo arquiteto, Oscar Niemeyer — mestre em pleno exercício profissional a sinalizar para a força rejuvenescedora da criatividade e da inserção política.
Aqueles jovens arquitetos dos anos 1930, tão poucos, que ajudaram a construir o país com obras-primas e o sonho de um Brasil com espaços de qualidade ao desfrute de toda a população, têm prosseguimento, agora, multiplicados à centena de milhares.
Não será pequena a tarefa dos arquitetos brasileiros nas próximas gerações. Mas nada que seja muito diferente do sonho de seus antecessores e do que deles espera a sociedade.

Santos x Barcelona -a majestade do futebol-

Sérgio Magalhães

Disseram os comentaristas que quase foi um massacre o que o Barça fez com o Santos, na final do campeonato mundial, no Japão. Parece que 4 a 0 até que foi pouco.
A organização tática foi criticada, a diferença técnica também. Comentaram que o Barcelona adotou uma “filosofia” e persistiu até alcançar bons resultados.
Provavelmente, tudo isso será fundamentado.
Tenho, para mim (e agora para os que vierem a este blog), que há uma condição primeira ainda pouco avaliada entre os times brasileiros: o protagonismo do jogador.

Aqui, quando é feito um passe, o jogador em geral espera que a bola chegue até ele. Ele não vai em direção à bola, para recepciona-la, para saudá-la. Fica onde está, senhor de si.
É o momento em que mais ocorrem os desarmes, como ficou evidente hoje. O adversário se adianta e surpreende o receptor acomodado. Basta conferir em qualquer jogo do campeonato brasileiro: parece que a corda é dada no jogador apenas depois que a bola chega nele.
Mas não é apenas isso.
É que, por detrás da inação, se encontra uma atitude arrogante autocentrada: “sou eu o espetáculo, não é essa redonda. Ela que venha a mim”.
Ora, a bola é a majestade do futebol. Pelé somente foi o Rei do Futebol porque casou com ela –e sempre a homenageou.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Desafios na Rocinha

Lucas Franco
A recente ocupação da favela da Rocinha pela polícia, para a instalação de mais uma UPP, jogou luz na oportunidade de investimento do Estado, em especial, a de enfrentar os desafios urbanísticos da área visando a melhoria de vida da população.

Nesse contexto, uma discussão me chamou a atenção: o governo anunciou diversas propostas, algumas de eficácia questionável, como a construção de um teleférico, contrariando especialistas, particularmente o arquiteto Luiz Carlos Toledo, autor do Plano Diretor da Rocinha, do seu Complexo Esportivo, e historicamente comprometido com a causa.


A seguir, selecionamos uma serie de artigos, entrevistas e depoimentos, publicados em jornais de circulação nacional. Vale a pena a reflexão.


15/11/2011 - Sérgio Magalhães para a Folha de São Paulo: "Pacificada, favela da Rocinha é desafio urbanístico"
19/11/2011 - Sérgio Magalhães para o Estadão.com.br: "Urbanismo, essa ourivesaria"
21/11/2011 - Editorial da Folha de São Paulo: "Urbanismo Pacificador"
               - Luiz Carlos Toledo para a FSP: "O teleférico e a tal vontade política"

23/11/2011 - Entrevista de Toledo para o jornal o Estado de São Paulo: "A comunidade não precisa de teleférico"