terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Tragédia em Nova Friburgo II

André Luiz Pinto
Foi publicado no O Globo de hoje uma reportagem divulgando o trabalho realizado pela COPPE/UFRJ sobre o que ocorreu na tragédia das chuvas na Região Serrana.
Segundo o estudo o evento natural foi tão raro que só ocorrerá novamente em cerca de 500 anos.
Uma combinação de fatores provocou a reação em cadeia que destruiu tudo que estava pela frente. Volume (mais de 400mm) e intensidade singulares, além do acúmulo natural das águas provocaram a derrocada de imensa quantidade de material como terra, árvores e pedras.
Segundo o Professor Paulo Canedo (COPPE):
–Foi como se tivessem caído 18 tempestades de verão seguidamente, com um enorme poder de destruição.
O Professor sustenta que, diante das proporções tomadas, a tragédia era inevitável. No entanto, defende que se houvesse maior prevenção as consequências poderiam ser reduzidas:
–Contra um ataque cardíaco fulminante não se tem o que fazer, mas isso não quer dizer que não devamos ter uma vida saudável, porque serve para proteger contra pequenos desvios do coração. Na Serra, era necessário haver uma política de ocupação adequada, projetos de mitigação de efeitos de cheia, por exemplo. Não evitaria a catástrofe, mas, em vez de morrerem mil, morreriam a metade talvez.

A cidade cresce para a Barra

Sérgio Magalhães
Em 1970, o IAB premiou um vídeo com o título acima, que reproduz em grande parte a Memória do Plano Lucio Costa. Com desenhos de muito interesse e ideia clarissima, como sói acontecer com textos do grande arquiteto, a visão estratégica é desde o então Estado da Guanabara.
O Rio pensava-se uma cidade isolada em seu território administrativo. Nada de Região Metropolitana. Está destacado no vídeo a proposta de refazer uma nova capital, um novo coração, um novo Centro Metropolitano lá na Baixada de Sernambetiba.
À época, imaginava-se um grande e permanente crescimento da população (fato que os anos seguintes não confirmaram) e uma expansão da ocupação urbana quase infinita (fato que os interesses imobiliários e os planos do tipo MC,MV ainda querem tornar realidade). No entanto, está também destacado no Plano o desejo de manter agrícola toda a região das Vargens.
Hoje em dia, quando sabemos como é importante a articulação metropolitana e como o Centro Histórico é essencial para a identidade coletiva –para além da economia urbana, este vídeo é um elemento importante para a reflexão.
Ele foi resgatado há alguns meses e frenqüentou comentário neste CI. Agora, está em destaque no site da vereadora Sonia Rabello.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Babilônia e Chapéu Mangueira

Eduardo Cotrim
As pessoas comentam, mas não tinha conhecido ao vivo, até ontem, uma comunidade com UPP. O acesso à Babilônia é tranquilo, claro, tem uns camburões em dado ponto da ladeira, mas não parecem bem uma blitz - dão a entender que estão lá para garantir o livre entra e sai dos moradores e visitantes.
Mesmo sabendo que na Babilônia havia UPP há uns dois anos, imaginei o óbvio. Que passado o camburão e os policiais bastante educados, encontraria aqui ou ali algumas daquelas figuras sinistras, sentadas estranhas como de sempre, mas não vi nenhuma. Se têm, ficam escondidas, como no asfalto. Mas aí a culpa não é da UPP, que também não está lá para eliminar pessoas do mundo oculto.
Nas poucas dezenas de minutos que estive na Associação de Moradores, vi que é procurada por pessoas, grupos, instituições interessadas em implantar programas, fazer pesquisas ou simplesmente conhecer a comunidade. A espera no corredor era grande. O Vice parece que segura a onda.
Lá em cima a proximidade da floresta trás a sensação de quase uns 15°C a menos que aqui em baixo - portanto, para o bem da temperatura de todos, que se proíba a expansão da Babilônia e Chapéu Manguieira para o alto e para os lados.
E não é romantismo, a mim me pareceu nessa curta experiência, que essa tal de UPP promove um trabalho muito maior que o da segurança dos cidadãos cariocas, das balas perdidas. Promove, do meu ponto de vista, a possibilidade de democratização de territórios, mas no sentido de que através da abertura desses territórios, a sociedade se conheça melhor e revele o porquê de tanto fascínio pela história do Brasil e sua complicada trajetória.
Os caminhos para a pacificação são muitos tus, nós, eles, centenas, talvez milhares, mas o das UPPs foi o único praticado. Que venham outros juntos com o Morar Carioca e que tragam avanços substanciais ao Rio de Janeiro, sem qualquer romantismo, um forte candidato à capital do planeta.
Ainda em 2009, policiais começam a ocupar os morros Chapéu Mangueira
e Babilônia,no Leme, na Zona Sul (Foto: Aluizio Freire)

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Tragédia em Nova Friburgo

André Luiz Pinto
Impressionante o Vôo virtual sobre Nova Friburgo.
São as primeiras imagens de satélite sem nuvens após o desastre do mês passado.
Divulgado no You Tube, o vídeo foi produzido pelo INPE com imagens de satélite do International Charter Space & Major Disasters. (Imagem Geoeye via USGS sobre DEM do Google Earth).
A dimensão da tragédia é tão gigantesca, que é difícil imaginar por onde começar.


Você tem uma opinião que possa ajudar na reconstrução das cidades serranas?
Então comente este link e vamos iniciar um debate que contribua para o futuro destas cidades!

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

De olho... (Por um legado efetivo)


André Luiz Pinto
Extremamente positiva a iniciativa da Prefeitura de criar o Conselho do Legado da Cidade.
A realização de grandes eventos internacionais como a Copa do Mundo (2014) e os Jogos Olímpicos (2016), trazem atrelados a eles importantes projectos urbanos, infra-estruturais, de recuperação de áreas degradadas, de desenvolvimento e, mesmo de expansão da cidade.
A conjuntura apresentada de alinhamento entre o especial momento económico e político vivido pelo país e a possibilidade de realizar estes eventos resulta numa perspectiva positiva para a cidade na próxima década. Porém é fundamental perceber, “o que isso significa em probabilidades de sinergia e efeitos catalíticos – ou de metástase, se nos enganarmos”.
O Rio pode não admitir erros e deve estar preparado para contorná-los o quanto antes.
Por isso a criação do Conselho de Legado para a Cidade é iniciativa muito bem-vinda.
O Conselho terá a participação de diversos segmentos da sociedade e nele estará presente o IAB-RJ representado pelo seu Presidente, Arquiteto Sérgio Magalhães, que expressou a posição do Instituto:
A ação do IAB é de cuidado em relação à cidade. Portanto, nos sentimos perfeitamente à vontade para analisar cada um dos investimentos que vierem a ser feitos em relação à Copa do Mundo de 2014 e às Olimpíadas de 2016. São investimentos que devem qualificar ainda mais o Rio de Janeiro para que sua população possa recolher os melhores benefícios: melhores condições de mobilidade, habitação e de saneamento, por exemplo. São elementos que parecem estar distantes dos Jogos, mas isso não é verdade. Os investimentos se multiplicam quando buscam se apoiar mutuamente.
- Assim como a cidade é diversa, os modos diversos de se enxergar o Rio de Janeiro também ajudam na busca de melhores soluções. Essas soluções precisam partir de ideias e serem debatidas.
O debate e o acompanhamento pode ajudar a retificar o descompasso entre as demandas da cidade metrópole e as demandas estabelecidas pelos eventos.
Só com a maior sobreposição possível dessas demandas é que poderemos garantir um legado efetivo para a cidade. 

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Mais uma do Metrô...

André Luiz Pinto



O que se passa com o Metrô no Rio de Janeiro?
Parece que não houve aprendizado nenhum com o horrendo viaduto da Av. Francisco Bicalho e a estação mais esquisita do mundo em frente a Prefeitura...


O arquiteto Washington Fajardo escreveu um manifesto, que assino embaixo:


Manifesto pelo fim da adolescência na arquitetura ou pela calma

Acredito na arquitetura.
Acredito piamente na contribuição da arquitetura e dos arquitetos para com a paisagem natural.
Acredito na engenharia e na técnica.
Acredito que a instalação de elementos marcantes na paisagem podem ser decisivos na regeneração de contextos degradados ou depreciados. Ou trazer adensamentos oportunos e revitalizadores.
Acredito que elementos verticais na paisagem não são incompatíveis a priori com contextos históricos e ou naturais. Podendo trazer boas soluções.
Acredito no design.
Mas quem tem pedra da gávea não precisa de ponte estaiada.
O que quer o metro com tais elementos? Ponte treliçada, passarela metálica, ponte estaiada...
Há algum complexo de inferioridade infra-estrutural?
Seria o metrô um adolescente rebelde pela paisagem carioca?
Calma...
Precisar não precisa.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Silêncio sobre o Plano Diretor


Andréa Albuquerque G. Redondo*
O novo Plano Diretor para a Cidade do Rio de Janeiro, será sancionado:atribuição do Executivo e Legislativo municipais e obrigação constitucional desde 1988, é lei de especial interesse para urbanistas, arquitetos e juristas. As conseqüências de sua aplicação dizem respeito a todos.
Graças à permanente e importante condição político-administrativa do Rio, a cidade sempre foi alvo de normas urbanísticas. Inúmeras. O Plano Diretor Decenal que está em vigor, de 1992, foi elaborado com participação ativa da sociedade civil. Compilou normas existentes, teve avanços e méritos: fortaleceu princípios das Políticas Sociais, consolidou conceitos sobre a Proteção do Meio Ambiente e do Patrimônio Cultural e estabeleceu fundamentos para igualar o valor da terra, só mais tarde presentes no Estatuto da Cidade.
Denominou-se Decenal por ter sido prevista sua execução em dez anos,obviamente por excessivo otimismo do legislador, tamanha é a complexidade da metrópole.
Ao ser revisto a cada 5 anos, se necessário, poderia ser objeto de inovações e adaptações conforme a dinâmica da cidade assim o exigisse. Caberia acrescentar poucos instrumentos da política urbana previstos no Estatuto em 2001, porventura ainda não contemplados.
O texto aprovado pelo Legislativo e em vias de ser sancionado pretende ser o seguimento de proposta apresentada oficialmente em 2006, que fora objeto de audiências públicas, debates, e sugestões, mas cujo andamento estava paralisado. Pela primeira vez um projeto de lei complementar propunha regulamentar a figura do Solo Criado, conquista do Plano de 1992 que, se aprovada, modificaria as práticas do mercado imobiliário e, provavelmente, induziria a distribuição dos ganhos vindos da importante indústria da construção civil e beneficiaria programas habitacionais para a população de baixa renda. A idéia não prosperou.
As alterações feitas no texto de 2006 a partir de 2009 permitem afirmar que trata-se de um novo projeto de lei. O cerne do futuro Plano – aumento e venda de índices construtivos na cidade, não guarda relação com os objetivos do Solo Criado. Esse aspecto central somado ao resto do conteúdo diverso comprova que se trata de lei reescrita pela nova gestão municipal. Basta comparar as laudas.
Seria cabível apresentar novas idéias, não fosse o texto consolidado ter vindo a público apenas há poucos dias, sem que tenha havido divulgação prévia e sequer tempo hábil para análise por técnicos, instituições acadêmicas e associações de moradores. Seria cabível apresentar um novo Plano, não fosse no rastro de processo legislativo iniciado há quatro anos com etapas já cumpridas, referentes a projeto de lei agora descaracterizado.
Também motivo de apreensão, em paralelo ao estranho processo legislativo outras leis foram aprovadas à revelia do Plano atual: por exemplo, o estímulo à construção nas várzeas e encostas frágeis do Maciço da Pedra Branca nos limites de importante bacia hidrográfica da Zona Oeste, onde os alagamentos são freqüentes; a previsão de torres com 30 andares na Cidade do Samba, recém construída com recursos públicos; a alteração da Reserva Biológica de Guaratiba; e os privilégios construtivos e fiscais criados para a indústria hoteleira sob a bandeira dos eventos internacionais de 2014 e 2016, como se as importantes conquistas justificassem servir-se do solo urbano indiscriminadamente.
Apresentado sob o foco de uma desejada e teórica cidade sustentável – qualquer uma - o Plano Diretor do Rio de Janeiro a caminho é figura de retórica, que, sutil e silenciosamente, poderá validar decisões que desrespeitaram as normas vigentes e anular a possibilidade de regulamentar a distribuição dos ônus e benefícios inerentes à urbanização da terra, diretriz preconizada no Plano Diretor de 1992 e mantida pelo Estatuto da Cidade.
Tudo em meio à falta de transparência e à ausência de um documento ordenado para leitura, fatos questionáveis dentro de um processo legislativo do qual somente se poderiam esperar lisura e a defesa da cidade.
No mínimo, perde-se a oportunidade para aperfeiçoar o principal plano urbanístico do Rio de Janeiro.
Rio de Janeiro, 20 de janeiro de 2011.
Dia do santo padroeiro da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro.
*Arquiteta

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Enchentes em SP: um velho problema, novos desafios.


Angélica Benatti Alvim*
Alagamento na Marginal Tietê (Foto: P.Toledo Piza/G1. http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2011/01/vitimas-de-enchente-em-sp-irao-receber-r-1-mil-diz-alckmin.html)
As enchentes que atingiram São Paulo nas últimas semanas não é um fato novo. Com raras exceções, anualmente de janeiro e março os jornais noticiam graves ocorrências. No entanto, este ano ultrapassou o recorde de chuvas que atingiram a cidade em janeiro de 1943 ̶ 493,7 mm contra 481,4 mm, quase o dobro da média para o mês (261 mm). Se em 1943 os efeitos foram perversos, hoje, com 11 milhões de habitantes, os efeitos são catastróficos.
Não é um problema simples e não existem soluções prontas.
Além das mudanças climáticas (como o efeito el Niño) que castigam diversas cidades do país e mundo, no caso de SP, a urbanização ocorrida de forma intensa foi amparada por um conjunto de soluções de infraestruturas implementadas, ao longo do tempo, em sua maioria emergencial, setorial e desarticulada, privilegiando interesses políticos e econômicos em detrimento dos interesses públicos.
Ainda nos anos 1920, o Plano de Melhoramentos do Rio Tietê, de autoria do Engenheiro Saturnino de Brito, previa a retificação do rio em conjunto de soluções que poderiam minimizar os problemas atuais das enchentes e dotar a cidade de qualidade urbano-ambiental. Mas, foram descartados tanto a lagoa de controle de cheias (que poderia ser parte de um belo parque), junto à ponte das Bandeiras, um dos locais de maior incidência de enchentes, quanto o projeto do represamento do rio, à montante de São Paulo, que poderia regularizar as cheias e possibilitar reservas para abastecimento de água. A solução encontrada pelos gestores públicos foi implantar parcialmente a retificação do Tietê e, ao mesmo tempo, dotar as suas várzeas de vias marginais, paralelas à ferrovia, que viriam dar suporte ao modo de transporte individual em detrimento ao transporte público.
Percurso natural do rio Tietê e a proposta de melhoramento.
Fonte: ZUCCOLO (2000)
Como parte deste quadro, a industrialização articulada ao setor de transportes não só privilegiou a expansão do sistema viário sobre o leito dos rios, retificando-os ou mesmo tamponando-os, como também a exploração dos recursos hídricos voltou-se para o setor hidrelétrico, para viabilizar a indústria em detrimento ao abastecimento de água. Soma-se a ausência de políticas habitacionais, que contribuiu para o espraiamento da mancha urbana, que por sua vez, em um circulo vicioso, degrada ambientalmente a cidade. Embora, atualmente diversas obras de saneamento e de drenagem venham sendo implantadas, os esgotos domésticos são ainda, em grande parte, lançados diretamente nos cursos de água, convivendo a cidade com seus despejos e também com suas cheias.
Várias cidades do mundo já passaram por processos semelhantes. No entanto, principalmente a partir dos anos 1990, muitas delas vêm implementando planos e projetos de tratamento dos corredores fluviais que se integram ao meio urbano. São as tais cidades vitoriosas, que Sérgio Magalhães se referiu em artigo recente (Jornal O Globo, 18/01/11), “[...] que souberam ajustar suas razões às da natureza”, pois foram objetos de planos e projetos complexos, intersetoriais e corajosos, aliando medidas estruturais às não estruturais de longo prazo (inclusive tratando 100% dos seus esgotos).
Para finalizar, lembrando comentário que já fiz neste blog: “É urgente e necessário rever alguns paradigmas relativos à ocupação urbana em sua interface com a "natureza" já modificada. É preciso incentivar e viabilizar projetos socialmente inclusivos que promovam uma cidade compacta e diversificada ao invés da urbanização extensiva de nossas cidades que é cara e danosa ao ambiente e à sociedade”. No caso de São Paulo, espero que gestores públicos se conscientizem disso, pois não é uma tarefa fácil, mas é parte do desafio a ser perseguido em prol de uma cidade possível.
*Arquiteta e Urbanista, professora e Coordenadora da Pós – Graduação da FAU – Mackenzie.