sábado, 30 de abril de 2011

"O novo centro metropolitano"

Mauro Osório
Ontem o O Globo publicou, um Suplemento Especial, com a seguinte matéria dae capa: "Rio se transforma na capital dos novos imóveis comerciais".

Na matéria existe o seguinte trecho: "Graças às expectativas geradas pelas obras de infra-estrutura viária, grandes empreendimentos são anunciados na Barra e no entorno da Baixada de jacarepaguá. Ali, a Avenida Embaixador Abelardo Bueno desponta com ambições de se tornar o novo centro metropolitano do Rio, como teria imaginado, há 40 anos, o arquiteto e urbanista Lúcio Costa".

Ainda na matéria, existe o seguinte destaque: "O futuro centro do Rio vai ser a Barra da Tijuca; o centro metropolitano será o que a Avenida Rio Branco é hoje" (citação, destacada na matéria, de Caetano Sani, diretor da Brookfield Incorporações).

Será que essa é a estratégia adequada para a cidade, ou deve ser reforçado o centro histórico e a zona portuária, como área central, conf orme política desenvolvida pela Prefeitura?

Ô abre alas que eu quero passar...



Eduardo Cotrim
Tudo que ligue dois pontos de modo mais eficiente é fundamental, mas é sabido que a eficiência da ligação não significa sempre o melhor percurso aparente.

A ponte Rio-Niterói, por exemplo, poderia ser reduzida a quase um terço de sua extensão, se saísse das proximidades do Santos Dumont e chegasse do outro lado da baía, no bairro do Gragoatá. Houve certamente motivos na época, embora de fato os desconheça, para ter sido erguida onde foi. Nesse caso, a eficiência existiu, presume-se, embora não tenha coincidido com o melhor percurso aparente.

O próprio Santos Dumont já foi exemplo de ligação eficiente, mas de menor trajeto. Atravessava-se o pilotis, tomava-se um café e entrava-se direto na pista para pegar o avião, a poucos metros da calçada. O anexo que foi construído quebrou essa lógica.

Mas para além da eficiência, há outro aspecto, a relevância. Como eficiência e relevância não deveriam ser coisas desconexas, mas são, no sentido de que basta uma delas para se construir alguma coisa, sendo que pode-se ainda construir alguma coisa sem nenhuma delas, importa haver equilíbrio entre os dois aspectos.

É o que se espera no Rio, dos quatro grandes projetos de ligação entre bairros, que no momento estão sobre a mesa: Ipanema - Barra da Tijuca, Deodoro - Barra da Tijuca, Aeroporto - Barra da Tijuca e Santa Cruz - Barra da Tijuca. A primeira, via Metrô, as demais por corredores expressos.

Sem números e estatísticas, não se põe em dúvida a sinceridade no entendimento de que esses sejam os investimentos mais relevantes em transportes para os Jogos e para o Rio, como legado.

Fato é que a Barra sediará uma parte importante das Olimpíadas e está numa área distante do Centro, da Zona Norte, da Zona Sul e mesmo da Zona Oeste, o que faz com que os investimentos em transportes se revistam de maior sentido.

No entanto, há outras ligações nada eficientes e bem mais relevantes.

Evidente, se fosse possível hoje executar ao mesmo tempo conexões rápidas entre todos os bairros da cidade, nenhuma delas seria mais relevante que as outras. Mas não é o caso, não há recursos para todas, o que torna a relevância de uma relativa à de outras.

Os trajetos até hoje mais populosos, os do Centro – bairros da Zona Norte, são culturalmente relevantes e historicamente conturbados, embora o Centro e a Zona Norte sejam o espírito da cidade. Não é questão de bairrismos - o que o carioca e sua cultura produziram para o país e para o mundo não teve tempo de vir da Barra da Tijuca. Mas não se trata de implicar com os BRTs Rio – Barra da Tijuca, já consumados. Trata-se de aproveitar a oportunidade e também olhar a cidade nos trajetos dos maiores deslocamentos e de suas raízes.

A cultura carioca para todos é a dos nascidos e moradores da Zona Norte, Chiquinha Gonzaga, Lima Barreto, Cecília Meireles, Nelson Cavaquinho, Almirante, Noel Rosa, Ataulfo Alves, Moreira da Silva, Nelson Rodrigues, Tom Jobim e os que fizeram as fundações da ponte Rio-Niterói, o pilotis do Santos Dumont... e a dos nascidos e moradores do Centro e arredores, Machado de Assis, Ernesto Nazareth, as filhas do presidente Afonso Penna, mães do carnaval de rua carioca, Villa-Lobos, Di Cavalcanti, Pixinguinha, Ismael Silva, fundador da primeira escola de samba no Estácio, Cartola, Carmem Miranda.

O Centro do Rio e seu patrimônio há muito decaem. Do Paço Imperial ao Largo de São Francisco, da Ouvidor à Praça da República. Algo a ser pensado. Não para os Jogos, para nós - a Zona Norte, com tamanho crédito com a cidade pede socorro aos bons meios de transportes.

Retoma-se a sugestão mais do que cantada pelo(a) Cidade Inteira, como justiça à história do Rio: a conexão Centro – bairros da Zona Norte. Com vagões rápidos, pontuais, ar condicionado, estações decentes, facilmente acessíveis.

E salve Estácio, Salgueiro, Mangueira, Osvaldo Cruz e Matriz...

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Assis Reis

Sérgio Magalhães

Nascido em Aracaju, criado na Parnaíba, cidadão de Salvador, arquiteto do Brasil. A obra de Assis se diferencia no conjunto arquitetônico moderno brasileiro. Na luz, na cor, na mescla de volumes e de tecnologias, na multiplicidade de intenções, é uma obra rica e complexa. Não é linear.

Assis era uma figura. Amigo atento, bem humorado, dançarino (dizia...), jogador, baiano. Sua verve era iluminada e seus enunciados tinham colorido. Seus projetos são instigantes; não nos deixam indiferentes ao vivenciarmos seus espaços.

Sua arquitetura evidencia uma enorme intuição, cultivada no âmago da cultura brasileira. Arquiteto até o fim, sempre, nunca deixou de especular sobre a cidade, o edifício, os materiais, o fazer.

Dois projetos de Assis Reis não chegaram à concretude –o pavilhão para Osaka e o Centro de Identidade Cultural. O primeiro, recebeu destaque no concurso nacional para a escolha da representação brasileira na Exposição Universal do Japão, em 1970. O segundo, é fruto de sua determinação em promover a cultura da cidade, a partir do “modelo reduzido” de Salvador, que construiu nos anos 1970. Mas essas duas concepções, absolutamente singulares, foram fundidas em um só estudo, que apresentou ao governo da Bahia há poucos anos.

Como a cidade do Salvador teria se enriquecido com essa obra! Quem sabe ainda possa ser reabilitada essa idéia? http://www.vivercidades.org.br/publique_222/web/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=1486&sid=12

Infelizmente, o registro de seu trabalho é precário. Essa lacuna precisaremos suprir, seus amigos, admiradores, estudiosos da arquitetura. Será mais do que uma homenagem a este sempre jovem arquiteto brasileiro, que nos deixou no apogeu de seus 85 anos; será um resgate em benefício da arquitetura e da cultura brasileiras.

Viva Assis!

Veja: www.assisreis.blogspot.com e http://pt.wikipedia.org/wiki/Francisco_de_Assis_Reis

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Universo urbano sustentável e cidades pós-contemporâneas

Eduardo Cotrim

O Universo se tornou finito e ganhou um começo na era contemporânea. É pouco relevante aqui se a finitude do Universo tenha vindo da premissa inversa, a de que um dia surgiu, logo é finito. Fato é que a infinitude nunca pareceu algo muito bem aceito. Ainda que a inexistência absoluta, aquela que precede à coisa surgida, seja uma idéia igualmente desconfortável, quase insustentável, opta-se, contudo, pela noção de começo, de advento. Advento do Universo, do Planeta, da História, da Cidade, da Antiguidade e da Contemporaneidade...

Quanto a essa última, a mais complexa, sabe-se que teve início entre os anos 1940 – 1960. Pode ser um registro particular, com base em informações não avaliadas de forma adequada, mas por outro lado, se coisas como arte, ciência, cultura e urbanismo são ditas como contemporâneas, do mesmo modo como são ditas modernas, pós-modernas, clássicas e neoclássicas, é justo que a Contemporaneidade adquira também seu direito ao declínio.

No entanto, ao menos no Planeta, viver num mundo pós-contemporâneo é por princípio absurdo. Mas enfim, um absurdo com o qual se deve conviver, pois, inevitavelmente, o presente carecerá de limites, se é que já não se expandiram o suficiente.

A pós-contemporaneidade parece fazer algum sentido (além do seu lugar no fim dos tempos), num dado modo de observação da história, ecológico no sentido mais amplo, a partir do universo espacial de coisas terrenas, familiares e cotidianas.

As cidades aparentam ser o melhor termômetro da relação dos homens com os tempos do seu mundo. Se as melhores cidades do Planeta representam o tempo corrente, as demais, que comungam da mesma estrutura lógica, estão atrasadas - não são contemporâneas, pertencem ao passado da civilização urbana, se o termo não for redundante. Por sua vez, se as piores se identificam com o nosso tempo, as outras, obrigatoriamente, já ocupam diferentes posições no futuro.

Na primeira hipótese, onde o presente convive com o passado, as cidades que não se alinharam a tempo, no tempo em curso, para fazê-lo, ou precisam de mais tempo extra ou de muitos recursos extras, que não estão disponíveis. Aqui, a sustentabilidade é preservacionista, sobretudo do meio ambiente externo ao homem, tudo no mais é utopia e a Contemporaneidade permanece em vigor.

Na segunda, do presente em convívio com o futuro, exige-se talvez desse último, uma redução na produção de mais e mais conforto, aumento da durabilidade dos bens e seguramente um uso maior da inteligência. Aqui há previsões e utopias - a cidade sustentável acrescenta ao homem, o meio ambiente se acrescenta a ela e esta, um dia, ao futuro do presente...

terça-feira, 12 de abril de 2011

A democratização da cidade

*Artigo publicado originalmente no Globo de 09/04/2011
Sérgio Magalhães
Todos desejamos nossas cidades bem tratadas, funcionais, amigáveis. Sim, mas no cotidiano urbano estamos acostumados com cenas de desrespeito às posturas públicas, de uso inadequado do espaço coletivo, de descaminhos no trato de bens comuns.
Mas, se tais atitudes surpreendem o visitante, nem sempre afetam o olhar local. Quais seriam as razões desse quadro de incoerência entre o desejado e o vivido?
Penso que entre elas se encontra a ainda baixa democratização da cidade, que se expressa por assimetrias importantes na prestação dos serviços públicos.
A baixa democratização, infelizmente, não é um discurso. A prática urbana brasileira demonstra a grande escassez de serviços públicos nas áreas pobres. Sabemos (e nos acostumamos) que nelas há carência de esgoto e de abastecimento de água, falta transporte, que o espaço público é mal tratado, manutenção e conservação quase inexistem, que é intermitente ou ausente o serviço público de segurança.
As assimetrias intraurbanas têm seu corolário na baixa exigência. Como a cidade é una, e vivida por todos,os padrões de exigência tornam-se muito tolerantes — e se rebatem pelo conjunto, desqualificando-o. Aceita-se conviver com inacessibilidade nos passeios, obstrução no trânsito, vazamentos nas redes de infraestrutura, buracos sucessivos, manutenção precária,enfim, incivilidades.
Urbanisticamente, há uma consequência pouco estudada: a mobilidade demográfica na cidade. Isto é, por carência dos serviços públicos, degradam-se algumas áreas e os moradores são estimulados a se mudarem para outros bairros. Muitos o fazem para áreas de expansão. Mas, na medida em que as cidades se expandem, mais rarefeitos e mais assimétricos tendem a ser os serviços.
No Rio, há o exemplo da Zona Norte suburbana. Mesmo estando muito bem situada no contexto da metrópole, milhares de seus moradores optam por emigrar à conta das condições insatisfatórias da área, que se eternizam. O enfraquecimento da região é explicado em geral pelo esvaziamento industrial, mas é preciso considerar o papel da degradação dos serviços públicos,em especial o da segurança. É ilusório achar que será possível combater a desigualdade por decurso de prazo — sem políticas específicas.
Veja-se o caso da retomada dos morros da Penha e do Alemão, em uma política específica que se opõe à degradação. Retomado o coração da Zona Norte, tendem a melhorar os serviços públicos, e os bairros da região, hoje deprimidos, poderão ter um rejuvenescimento no seu parque imobiliário e habitacional, retendo seus moradores.
Tínhamo-nos esquecido que a cidade é o lugar da liberdade. “O ar da cidade liberta”, diz o provérbio medieval. E que o papel fundador do Estado é garantir a segurança. Ela garantida, o jogo da democracia poderá redirecionar prioridades.
Assim, o desafio se voltará para os demais serviços públicos urbanos, no objetivo de reduzir assimetrias injustas.
Muitas cidades brasileiras têm feito o esforço de construir infraestruturas, buscando ampliá-las para as áreas mais carentes. No Rio de Janeiro, a urbanização de favelas já tem boa experiência e é meta da cidade, assumida pelo prefeito, de assegurar que até 2020 todos os assentamentos informais estejam plenamente urbanizados. Esse programa, Morar Carioca, se constituiria como o principal legado social dos Jogos de 2016. A tarefa não será fácil, mas é possível.
Contudo, seja no Rio ou nas cidades que buscam equalizar a oferta de infraestrutura, a manutenção dessa nova realidade implicará em custos financeiros permanentes. Em compensação, serão reduzidos os custos sociais e as perdas de oportunidades e de empreendedorismo que o ambiente degradado acarreta. De todo modo, será preciso uma atenção especial para que os investimentos não se percam. É um trabalho que extrapola os governos e precisa envolver os cidadãos.
Quando as sociedades ficaram atentas para as desigualdades sociais, concebeu-se um acompanhamento que pudesse ajudar a percebê-las de modo sintético: o Índice de Desenvolvimento Humano, o IDH. Ele tem sido muito útil nas comparações e verificações dos avanços conseguidos.
Quem sabe devamos pensar em indicadores de atendimento dos serviços públicos urbanos? Algo como um IDC, índice de democratização da cidade, que ajude a monitorar a redução das assimetrias na prestação dos serviços. Que nos informe como eles estão no cotejo entre as cidades, mas também que possam informar sobre os bairros de uma mesma cidade.
Afinal, as cidades do século XXI, motores do desenvolvimento, requerem ser lugares seguros, funcionais,democráticos. No Rio, reduzidas as assimetrias, aflorarão com mais força as virtudes da cidade existente, múltipla,diversa, amigável. E o cidadão poderá fundir o desejo e a realidade em sua prática urbana.

terça-feira, 5 de abril de 2011

De metrô a trem

Lucas Franco
Parece que a Metrô-Rio entendeu errado o movimento defendido aqui no CI, pela transformação dos trens em metrô, potencializando a recuperação de áreas suburbanas e da Zona Norte.
Hoje, junto com esta foto-flagrante, recebi uma reveladora mensagem do atento colega Antônio Augusto Veríssimo:
“Tirei esta foto hoje de manhã em um vagão do metrô. Além de não transformarem o sistema de trem em metrô, parece que já tentam transformar o metrô em trem. Neste caso trocaram as cadeiras duplas por longitudinais, como nos trens da Super Via, liberando mais espaço para passageiros em pé.”
E tudo isso na mesma semana em que a tivemos o aumento em mais de 10% no valor da passagem, passando de R$ 2,80 para R$ 3,10, tornando-se a mais cara do Brasil.
Pelo visto, a proposta do Metrô-Rio é a seguinte: reajuste nas tarifas e aumento no número de passageiros por vagão, logo, crescimento da arrecadação, para oferecer um serviço de pior qualidade.