segunda-feira, 26 de março de 2012

Desabafo

Sérgio Magalhães
Vale a pena ler o que a vereadora Sona Rabello escreveu em seu blog, a propósito do desencontro entre o presente e o futuro no debate sobre a nossa cidade. O tom é de desencanto, algo irônico, mas carrega uma proposta de reflexão sobre a representatividade política, a concepção de cidade e outras categorias de grande interesse para a vida das pessoas
É para pensar -e, se for possível, agir.

http://soniarabello.blogspot.com/2012/03/planejamento-urbano-no-rio-teoria-e.html 

Na moda

André Luiz Pinto
A nova composição de trens da Supervia surpreendeu, segundo informa o jornal O Globo. Veio mais magrinha, o que a afasta da plataforma onde seus futuros usuários a esperam (e como!). Veio também mais altinha, o que cria um degrau entre ela e o piso da plataforma.
A empresa concessionária diz que o problema será sanado com a construção de uma nova pavimentação sobre a atual, de modo a elevar o nível da plataforma e avançar um pouquinho sobre o vazio, eliminando o frestão criado.
Faltou explicar como substituirá ao mesmo tempo todas as outras composições, velhinhas, coitadas, e talvez por isso, mais gordinhas e baixotas –mas que se ajustam perfeitamente, há anos, ao figurino do Zé Povinho que a prestigia.


Pela Normalidade

por Roberto Anderson
Uma experiência, aparentemente banal, num dia comum de março de 2012 em trens do Rio de Janeiro
A viagem de ida ao Engenho de Dentro – Pego o trem "quentão" que vai para Japeri. É um trem sem ar condicionado, tão grafitado que os vidros das janelas não deixam ver o exterior. O trem sai da plataforma com lotação média, já que na parte da manhã a maior parte dos passageiros viaja no sentido oposto, dirigindo-se ao centro do Rio. Mal a viagem começa e o trem para, não muito distante da Central. Não há avisos que expliquem o que está acontecendo. Depois de algum tempo alguns passageiros jovens e mais exaltados forçam as portas para abri-las, ameaçando quebrar o vagão. Os demais passageiros aparentemente reprovam tal atitude, mas não se movem para impedir, nem mesmo quando os jovens tentam arrancar barras de metal do bagageiro. O trem volta à estação e os passageiros mudam para o trem parado do outro lado da plataforma. Não se ouve avisos que expliquem a movimentação dos passageiros, mas eles todos se mudam entre os dois trens uma, duas, três, quatro vezes. Sigo-os. Finalmente o trem parte e a viagem até o Engenho de Dentro transcorre sem mais problemas.

A viagem de volta à Central – Já sentado num banco da plataforma, ouço o serviço de alto falante anunciar que em aproximadamente dois minutos um trem com ar condicionado adentrará a estação. Esse anúncio é repetido diversas vezes ao longo de uns quinze minutos. Finalmente o trem com ar condicionado chega e está um pouco cheio. Os passageiros na plataforma embarcam, mas o trem não parte. As portas se abrem e se fecham inúmeras vezes, sem que se compreenda a razão. Não há avisos que esclareçam o que se passa. Muito tempo depois, ouve-se um aviso de que o trem estará em vistoria. Os passageiros descem para a plataforma. O trem apita e só uma parte dos passageiros consegue novamente embarcar, já que as portas dos vagões se fecham bruscamente. Mas o trem ainda não parte. As portas se abrirão e fecharão ainda muitas vezes antes que o trem siga viagem. Os passageiros olham seus relógios. Um, que leva quentinhas, avisa pelo celular que vai se atrasar. Por fim o trem parte e todos mantêm a expressão de estarem vivendo uma situação de plena normalidade do serviço de trens dos subúrbios do Rio de Janeiro.

Dos pisos do Planeta e da Zona Norte carioca

Eduardo Cotrim

Abre-se parêntese para manifestar um completo desconhecimento dos motivos pelos quais as coisas mais antigas se encontram enterradas. A Geologia e a Astrofísica poderiam explicar melhor aos leigos se o mundo ganha terra e diâmetro com o passar do tempo ou se o solo simplesmente engole aos poucos por gravidade tudo o que se põe na superfície do planeta.

Dito isto, busca-se qual seria a estética da cultura contemporânea legitimamente brasileira. É possível que tudo seja respondido daqui a algum tempo pela arqueologia, mas nesse caso, a estética que se procura agora já não será mais contemporânea e nunca a conheceríamos. Resta saber se futuros historiadores da cidade, antes mesmo das escavações, reivindicarão as vielas orgânicas dos antigos morros cariocas, aos modelos em escala 1:1 das favelas expostas nos stands dos antigos parques temáticos dos Estados Unidos e Japão. Ou se os telhados de fibra vegetal teriam sido introduzidos no Alto Xingu pelos resorts de Angra dos Reis. Que a história não seja nublada nem enterrada.

A Zona Norte do Rio é uma das coisas que se encontram na superfície do planeta. Tem vernáculos na memória coletiva carioca de cores, padrões construtivos, vozes, modos de conviver em vizinhança, letras e ritmos. Não seríamos a elite esclarecida carioca contemporânea, aquela que construiria, numa analogia sombria, nobres arquiteturas hispânicas sobre as cidades incas, não soterradas, mas pisoteadas.

A alma do lado pobre da Zona Norte, que migrou do Centro da Cidade e por tabela, dos tupis, de Santo Antônio do Zaire, de Lisboa, das cidades mouras, gregas, fenícias é a espécie de patrimônio que faz com que não se entenda como Pixinguinha compôs tamanhas músicas dissonantes e harmônicas ou como três andorinhas de cerâmica vitrificadas na varanda sobre fundo verde claro constroem lugares do nada.

O certo é que a porção do Rio de Janeiro dependendo dos ventos ou da flacidez do terreno – com a palavra os geólogos e astrofísicos - estará injustamente abaixo dos pisos inexpressivos das garagens dos espigões, se nós contemporâneos de amanhã, não nos dermos hoje por conta.

Criar oportunidades para que as atratividades da Zona Norte venham a ser de fato percebidas, desfrutadas a qualquer hora do dia e da noite, emergidas como patrimônio da cidade, resgatadas dos morros com melhores espaços de convívio, dos asfaltos das andorinhas, exigiria possivelmente algumas poucas revisões urbanísticas, alguns investimentos públicos e privados, alguns ensaios, mas, sobretudo, uma boa dose da melhor sinergia carioca de vontade, criatividade e bom humor.

quarta-feira, 14 de março de 2012

A cidade se esvanece

Sérgio Magalhães
*Artigo publicado originalmente no jornal O Globo de 10/03/2012.
A República brasileira herdou do Império uma capital quase colonial. Com cerca de quatrocentos mil habitantes, o Rio era uma cidade grande para a época, importante, a maior do país, com presença internacional. Mas sua estrutura urbanística era modesta, mesmo composta em associação com uma geomorfologia monumental, e sua infraestrutura era incipiente.
É nas primeiras décadas do século XX que o Rio se transforma urbanisticamente como metrópole. A cidade republicana constrói duas grandes estruturas espaciais, a do Centro e a da Orla, ambas extraordinariamente fortes — que se justapõem.
A primeira tem o Centro histórico como núcleo, e se organiza a partir das grandes obras do prefeito Pereira Passos. Constituiu-se como a verdadeira estrutura espacial da cidade porque construiu o Centro moderno e o porto, promoveu a interligação Centro-Zona Sul, através da avenida Beira-Mar, e a interligação Centro-Zona Norte, expandindo o sistema de trens urbanos. Emerge daí a “Cidade Maravilhosa”. No mesmo entendimento, implanta-se, depois, a área de negócios e de administração pública, no Castelo, e consolida-se a Zona Norte como o principal lugar industrial do país. O Aterro do Flamengo é o coroamento paisagístico dessa estrutura moderna focada no Centro e de interesse metropolitano.
Quase simultaneamente, a cidade constrói outra estrutura urbanística complementar, ordenada pela descoberta do mar como lugar de prazer. Do Flamengo ao Leblon compõem-se quinze quilômetros do binômio orla cidade, disponíveis para a interação social e a beleza. Concebeu-se em simbiose a arquitetura da cidade e a praia. Não é um balneário, é cidade; a praia é pública, de acesso republicano, bem diferente do que se apresentava nos países desenvolvidos à época. O espaço cidade-praia, em uso todo o ano, é lugar denso, cosmopolita e metropolitano.
Ambas as estruturas, a do Centro e a da Orla, sustentam uma cidade metropolitana de grande multiplicidade espacial (seus bairros têm identidade e morfologia próprias), com ambientes urbanos de grande vitalidade,que produz forte e original cultura, inserida no contexto mundial como uma de suas principais metrópoles.
Todavia, desde as décadas finais do século XX, nota-se um enfraquecimento estrutural importante da metrópole. Desconstruído o sistema de transporte sobre trilhos, em benefício do automóvel e do ônibus, as relações intrametropolitanas se esclerosam. Não há transporte de alto rendimento que atenda adequadamente aos deslocamentos casa-trabalho, majoritariamente vinculados ao Centro. Expande-se a ocupação em variadas direções, segundo conveniências quaisquer, sobretudo imobiliárias, com a baixa densidade típica do rodoviarismo. A expansão exagerada cria demanda insustentável por infraestrutura e por serviços públicos — mas não produz cidade. Constrói condomínios, shoppings, guetos, engarrafamentos, poluição — mas vida urbana, não.
Assim, prevalecem as facilidades de ocasião. Com 12 milhões de habitantes,a cidade metropolitana não está institucionalizada; apesar de preocupantes indicadores sociais, não conta com políticas públicas de transporte, saneamento, habitação, saúde, educação, urbanismo, que articulemos esforços dos diversos municípios e agentes públicos; faltam-lhe instrumentos políticos e técnicos que possam ajustar interesses conflitantes, sem permitir hegemonias senão as democraticamente constituídas. E igualmente grave: não projeta o seu futuro.
Mesmo tendo estruturas urbanísticas mais bem conformadas, o Rio dispersou-se tanto que, em poucos anos,trocou de posição com São Paulo: de cidade 15% mais densa, está 15% menos densa. (Lembremos: densidade não é sinônimo de espigão, mas de bom aproveitamento do solo.)
Ocorre que São Paulo nas últimas décadas tem se reestruturado urbanisticamente e investido em transporte de alto rendimento. A capital paulista constrói não uma linha de metrô, mas uma rede, que tem o Centro como núcleo, com 12 linhas de metrô e trem, mais de 30 estações de integração, e investe em 4 anos R$ 22 bilhões.
Curitiba, que se notabilizou como criadora do sistema de ônibus em corredor expresso,o BRT, optou por substituí-lo, implantando um sistema de metrô subterrâneo. Com 1,7 milhão de habitantes, a capital paranaense fortalece o seu Centro, quer ser uma cidade mais compacta, mais densa.
Dispersa, a cidade escasseia, a mobilidade paradoxalmente diminui (e aumentam os engarrafamentos). Sem densidade adequada, a vida urbanas e esvanece; o cobertor dos serviços públicos não cobre a cidade inteira. A metrópole do século XXI pede uma estrutura urbanística em acordo coma sustentabilidade ambiental, econômica e social. Ela tem precedentes: a cidade do convívio e da beleza, que a República herdou e soube estruturar maravilhosamente.

terça-feira, 6 de março de 2012

Pensando grande: a lição de Paris

Lucas Franco
Na última sexta-feira, aproveitando uma breve temporada no Brasil, o renomado arquiteto francês Philippe Panerai ministrou uma palestra na sede carioca do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB).
Vencedor do Grand Prix d’Urbanisme da França, em 1999, Panerai é professor de arquitetura da Escola de Belas Artes de Paris, professor associado da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre e mantém um escritório de projetos urbanísticos em Paris.
O tema da noite foi a Grande Paris, desde as primeiras abordagens na sua dimensão metropolitana até particularidades da recente consulta pública, com inúmeros escritórios de arquitetura e equipes multidisciplinares financiadas pelo governo, para estudar, compreender e projetar soluções para aquela Região Metropolitana.
Apresentando uma série de mapas e fotos das mais sortidas paisagens da região, Panerai nos contou sobre a importância de se articular as diversas lideranças políticas locais, reconhecer e valorizar as preexistências, as vocações e características dos lugares. E talvez o mais importante: pensar na Grande Paris, não significa, absolutamente, pensar em expandir-se a qualquer custo.
Ao final, incitado à reflexão, voltei para casa ainda tentando perceber o que de melhor poderia apreender com a lição parisiense.
Por aqui, nos anos 70, com a definição das regiões metropolitanas brasileiras, e no nosso caso, particularmente potencializado pela fusão dos Estados da Guanabara com o do Rio de Janeiro, criou-se a Fundação para o Desenvolvimento da Região Metropolitana, a FUNDREM. O conceito de planejamento integrado compreende que em muitos lugares as transformações no espaço urbano não acompanham precisamente as delimitações dos municípios, e ainda, na complexidade do contexto, não seria possível pensarmos em serviços essenciais, como o transporte e saneamento, isoladamente.
Mas apesar de até hoje ainda termos a região metropolitana do Rio de Janeiro reconhecida, como diversas outras no Brasil, com a extinção FUNDREM no final dos anos 80, atualmente, não contamos com um órgão específico para tratar o tema. As lideranças estão desarticuladas e a debate esvaziado.
Na outra ponta, se não pensa em conjunto, a prefeitura do Rio de Janeiro pensa em crescer. E não para de investir na sua expansão. Nota-se, por exemplo, na priorização dos projetos de mobilidade para zona-oeste, área de expansão da cidade, onde ainda existe oferta de grandes terrenos livres a preços menores. As construtoras e empreiteiras, é claro, agradecem e fazem a sua parte.
A lição de Paris, para o caso do Rio, não poderia ser mais dura: além de não estarmos mais pensando de modo metropolitano, seguimos pensando em expandir.

Mind the gap

Lucas Franco
O outro destaque da palestra de Panerai ficou com as histórias pitorescas sobre a disputa entre os parisienses e os londrinos sobre qual das cidades teria o serviço de transporte metropolitano mais eficiente.
Como seria uma covardia querer fazer qualquer comparação com o metrô carioca, prefiro seguir na linha das histórias, e contar a minha.
Sobre o metrô de Londres, a coisa que mais me chamou a atenção foi durante uma visita a uma loja de souvenires londrina. Nela você encontra camisas, canecas, chaveiros... Com três referências ao Metrô: a logo do sistema (underground), o mapa geral com as linhas e estações (tube-map), e o aviso de segurança “mind the gap”.
O mapa é especial, criado nos anos 30 por um funcionário da companhia, Harry Beck, viria a revolucionar o design de informação. Desde a implantação do sistema, os mapas eram feitos de acordo o posicionamento geográfico, contudo, como a densidade e complexidade de estações na zona central são enormes, e a extensão das linhas também, ao ampliarmos a área central torna-se impossível contemplar as linhas suburbanas em todas as suas extensões.
Considerando que a maior parte do percurso era feito no subsolo, Harry desenhou um diagrama, parecido com diagramas de circuitos elétricos, desprezando a precisão na localização física, mas valorizando as conexões e a articulação do sistema.
O Tube Map em 1808 e agora, em 2012
O resultado é uma trama tão rica e colorida que ainda consegue alcançar uma bela plasticidade.
É simplesmente incrível ver os londrinos reconhecendo o metrô como patrimônio, vendendo a sua imagem como souvenires, e os turistas, é claro, comprando. Um sucesso. E ao retornarem para casa e encontrar os amigos, estará lá, estampado no peito o que viram de melhor na cidade: o metrô.

segunda-feira, 5 de março de 2012

As lições de uma arquitetura atemporal

MUSEU HISTÓRICO de Ningbo, na China: o projeto mais surpreendente de Wang Shu é um ícone urbano e também um repositório de História
Washington Fajardo*
**Artigo publicado originalmente no jornal O Globo de 04/03/2012
A última segunda-feira ainda se iniciava, e debatia-se o reconhecimento do filme “O artista”pelo Oscar, quando outra obra silenciosa, mas vigorosa, era também reconhecida: o arquiteto chinês Wang Shu era anunciado ganhador do Pritzker de 2012, o Nobel da arquitetura.
Não tão conhecido como o Oscar, o Pritzker é um avaliador de momento e será, se longevo for, referência importante em um planeta no qual as escolhas de o quê, como e, até, por que construir serão decisivas. Temas de arquitetura e urbanismo serão cada vez mais usuais, de amplo domínio e debate. Hoje, a construção representa mais de 40% do consumo de energia mundial,e as cidades definirão o futuro da espécie se o homem não fizer melhores cidades. Por isso vale prestar atenção no Pritzker, e não nos vestidos.

Arquitetos-artesãos em alta
Desde a crise de 2008, há uma inflexão em curso. Saíram de cena prêmios para arquiteturas virtuosas— de arquitetos com muitas obras — para arquitetos-artesãos, com muito controle sobre temas raros, como a ancestralidade material (caso do suíço Peter Zumthor, premiado em 2009), a plasticidade do espaço (caso dos japoneses Kazuyo Sejima e Ryue Nishizawa, em 2010) ou a poética estrutural (caso do português Eduardo Souto de Moura,em 2011). Oscar Niemeyer e Paulo Mendes da Rocha são nossos orgulhos pátrios, premiados em1988 e 2006, respectivamente.
O chinês I.M. Pei já havia sido laureado em 1983, mas sua obra está nos EUA. É a primeira vez que um chinês com produção no seu país é premiado. É também um prêmio para a China. Mas o Pritzker faz uma recomendação crítica. “O fato de que um arquiteto da China tenha sido selecionado representa um importante passo no reconhecimento do papel que o país terá no desenvolvimentodo ideário arquitetônico.(...) O sucesso da urbanização chinesa será importante para a China e para o mundo. Esta urbanização (...) precisa estarem harmonia com as necessidades locais e suas culturas. As oportunidades (...) deverão estarem harmonia com suas tradições do passado e com suas demandas futuras por desenvolvimento sustentável”, diz o júri.
Esta é uma crítica aberta à opção pela via fácil da arquitetura espetaculosa, realizando uma importação estéril da estética ocidental. É crítica também à construção acelerada de cidades novas, planejadas, mas com baixíssima densidade populacional,que já começam a ser apelidadas de “cidades-fantasma chinesas”.
O ápice desse fenômeno parece ser a cidade de Ordos, na Mongólia, fundada em 2001, com população de 1,5 milhão, mas densidade de 18 pessoas por quilômetro quadrado (no Rio, são cinco mil por quilômetro quadrado). Ordos é um playground para a nova arquitetura, com magníficos edifícios vazios.
O mais recente deles é o Museu de Ordos, projeto do escritório chinês MAD Architects. O museu é uma cápsula amorfa. É inventivo e produz interessante resultado visual, mas não há como não se lembrar dos livros de biologia e ter a sensação de imersão em um monumental retículo endoplasmático. Apesar da analogia com a vida celular,porém, o museu é ainda estéril.
“O recente processo de urbanização chinês reacende a discussão sobre se a arquitetura deve ancorar-se à tradição ou olhar somente para o futuro. Wang Shu é capaz de transcender esse debate, produzindo uma arquitetura atemporal, com fortes raízes no contexto e ainda assim universal”, disse o presidente do júri, Lord Palumbo.
“Uma tradição perdida significa um futuro perdido”, diz WangShu, 48 anos, fundador, com sua esposa, Lu Wenyu, do escritório Amateur (Amador) Architecture Studio, em 1997. Sua definição de amador é quase a do dicionário:alguém que se engaja em uma atividade mais por prazer do que por benefício financeiro ou razões profissionais. Mas Shu substitui “prazer” por “amor ao trabalho”, numa clara alusão ao pensamento de Confúcio.
Sua produção é ainda pouco conhecida — não há livros sobre sua obra. Mas, apesar da pouca idade, Shu demonstra profundo controle das diferentes escalas do trabalho arquitetônico, assim como domínio de técnicas construtivas vernaculares, tendo passado certo tempo em canteiros de obras para conhecer práticas e artes construtivas tradicionais. Seu início profissional foi como restaurador de edifícios.
O projeto mais surpreendentede Shu, pela transição vigorosa entre proporções distintas e entre memória e contemporaneidade, é o Museu Histórico de Ningbo— um ícone urbano e também um repositório de História. O edifício é singularíssimo: incorpora vigor, pragmatismo e emoção.Wang Shu debruça-se sobre técnicas e materiais tradicionais de modo experimental, ao usar telhas e tijolos de demolições de edifícios antigos, produzindo uma textura nova, mas oriunda da memória sensível, com efeito poético e leveza mesmo em um edifício de grandes proporções.
Shu trabalhou com os operários e permitiu que eles pudessem intervir nesse arranjo de empilhamento, criando em grandes murais momentos de surpresa e evitando os riscos de padronagem. São grandes pinturas que se convertem em matéria,sustentação e paredes.
“Arquitetura não é mais importante para mim do que a vida. Eu não acredito que você possa ser um bom arquiteto se não tiver uma boa vida”, ele diz.

Um pouquinho de Brasil
Os conhecedores ou não de arquitetura irão reconhecer a semelhança com o ensinamento de Oscar Niemeyer: “O mais importante não é a arquitetura, mas avida, os amigos e este mundo injusto que devemos modificar.” E irão reconhecer, na articulação de tradição e contemporaneidade, os princípios que tornaram singular a arquitetura moderna brasileira, cuja maestria (de Lúcio Costa) no projeto do Parque Guinle estarreceu o mundo, assim como o antigo MEC, atual Palácio Gustavo Capanema.
Mas o reconhecimento mais importante que podemos fazer deste Pritzker é que, em momentos de grande desenvolvimento, de “muita construção, pouca arquitetura e um milagre”, devemos nos posicionar altivamente diante da memória e da sustentabilidade,buscando a atemporalidade da arquitetura que Wang Shu elabora com distinção e sobriedade. Buscar a dimensão mais humanista da arquitetura e das cidades. Este é o desafio em países que ainda oscilam entre opulência e escassez. China e Brasil, tão longe, tão perto.

*Washington Fajardo, arquiteto e urbanista, é subsecretário de Patrimônio Cultural, Intervenção Urbana, Arquitetura e Design da Prefeitura do Rio.

domingo, 4 de março de 2012

Uma cidade compacta, fluida e segura

André Luiz Pinto
por SP2040
A arquiteta, urbanista e professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie Angelica Benatti Alvim foi entrevistada pela SP2040 e nos proporcionou uma avaliação lúcida e coerente dos problemas da cidade de São Paulo. Para ela "Os eixos estratégicos do SP 2040 favorecem a discussão de tudo o que há de importante, eles incitam a discussão articuladora sobre a cidade que nós queremos…"
“Porque a questão dos deslocamentos também está atrelada ao uso do solo, à questão da habitação, à distância entre moradia e emprego etc.”


Segue aqui o link para a entrevista.
Vale conferir!