Sérgio Magalhães
*Artigo publicado originalmente no jornal O Globo em 04/08/2012.
Há poucos dias, foi divulgado acordo
firmado entre o Ministério Público Estadual e a Supervia, concessionária dos
trens urbanos do Rio. A empresa fará obra para reduzir o vão entre o trem e a
plataforma de embarque, na estação Triagem. Vamos entender: quando pára o trem
na plataforma, fica “fresta” com inacreditáveis 80cm de largura, que os
passageiros têm que pular.
A Supervia opera os serviços de
trem urbano desde 1998. Por que esperou ação do MPE para fazer essa obra
elementar?
Nesta semana, entrou em operação outro
trem importado da China. Serão trinta até 2014, em uma frota de cento e sessenta.
A concessionária diz que até 2016 todos serão novos ou reformados. Esse
objetivo é passo importante para a recuperação do sistema.
No entanto, grande parte das
estações está como em meados do século passado. As plataformas são descobertas,
expostas ao sol e à chuva. Os acessos são por escadas com altura equivalente a
três andares. Uma reforma dessa base física, para dar conforto ao usuário, não exige
importação da China, basta haver projeto e decisão. Os recursos são ínfimos, se
comparados com investimentos em rodovias.
A meta da Supervia é dobrar o
número de viagens, chegar a um milhão/dia. O mesmo que há quarenta anos, quando
a população era a metade de hoje. Pela abrangência da rede na metrópole, seria
possível transportar mais de dois milhões de passageiros/dia. Por que não buscar
essa meta? (O Rio é a cidade do país onde se gasta mais tempo na viagem
casa-trabalho.)
Tal questão se insere no quadro de precariedade
dos serviços públicos em nossas cidades. O saneamento na Baixada Fluminense
chega à espantosa cifra de apenas 0,5% de esgoto tratado em Nova Iguaçu, que
tem 800 mil habitantes. Também por isso, a despoluição da Baía de Guanabara pouco
progride. O que explica que novos corredores de ônibus imponham aos passageiros
usar escada e passarela para atravessar a rua que separa estação e calçada
–ambas no mesmo nível? É o privilégio ao automóvel, que elimina sinais de
trânsito em vias urbanas, apesar do corredor ser destinado ao serviço de transporte
coletivo...
Nestas décadas em que o país passou
de “eminentemente agrário” para “sexta economia”, nossas cidades foram maltratadas,
subjugadas ao interesse de outras políticas setoriais. Acostumamo-nos à carência
de investimentos em mobilidade, saneamento, habitação, à escassez de serviços
públicos.
De fato, as cidades subsidiaram o
desenvolvimento nacional.
Neste século 21, porém, as coisas
mudam. O desenvolvimento se dará a partir do conhecimento e da inovação, cujo
lugar é a cidade. Assim, o importante passivo sócio-ambiental urbano brasileiro
se coloca como um desafio estratégico a ser enfrentado. Onde, também por
exigência do avanço democrático, a universalização de bons serviços urbanos é
condição indispensável.
Trazer os serviços públicos urbanos
para a nossa contemporaneidade é obra coletiva, dos governos, da sociedade, de
suas organizações. Não será coisa simples. Há de ser uma agenda de todos.