Sérgio Magalhães
*Artigo publicado originalmente no jornal O Globo de 06/10/2012
Estamos vivendo um momento de eleições municipais.
Supostamente, os problemas urbanos brasileiros estariam no centro dos debates.
No entanto, não é o que se vê.
A organização político-institucional brasileira estabelece três
escalas de administração, compostas pela União, pelos estados e pelos
municípios, distribuindo as competências segundo esse principio.
Nossos estados são diversos, em área, em economia, em
história. Mas todos tem responsabilidades iguais, tais como a segurança pública
e o ensino médio. Assim ocorre com os municípios, a todos competindo as mesmas
atribuições, em especial as relativas à ocupação do território. Também o regime
eleitoral é o mesmo para todos os municípios, grandes ou pequenos, populosos ou
não.
No entanto, esta igualdade institucional que, em princípio,
é louvável, não é promissora em muitas situações. É o caso das grandes cidades.
Nas metrópoles, onde a complexidade urbana é enorme, o regime eleitoral pouco
contribui para o enfrentamento das questões espaciais, tais como a habitação, a
mobilidade e o saneamento.
Para o Legislativo municipal, votamos em um nome entre
centenas. Não há vínculos necessários entre o candidato e determinada região da
cidade ou algum tema urbano. Há poucas dezenas de vereadores representando
vários milhões de habitantes, onde os eleitos podem ter sido sufragados por
apenas alguns poucos milhares. Em países onde a urbanização é mais antiga, como
a França e a Inglaterra, os municípios são pequenos, permitindo uma representação
mais próxima. Na democracia, a relação entre representado e representante
precisa ser clara.
A igualdade entre competências municipais faz com que o
prefeito de uma grande cidade tenha atribuições gigantescas, porém,
paradoxalmente, restritas e parciais. Na mobilidade urbana, uma questão vital,
limitam-se ao modo rodoviário –e, assim mesmo, em parte. O sistema de trens e
metrô não é de sua competência; tampouco o de ônibus e vans interurbano. Logo,
o projeto de mobilidade para a cidade provavelmente será incompleto.
O prefeito de uma grande cidade, muitas vezes um colégio
eleitoral maior do que muitos estados, fica contido por atribuições deslocadas
da realidade. Em casos de cidades metropolitanas, que envolvem vários
municípios, seria indispensável uma representação política compatível. Ao
prefeito da cidade-núcleo, quase sempre a capital do estado, poderia competir
algum protagonismo político, sobretudo na articulação de ações metropolitanas.
Como hoje está, as cidades metropolitanas, em geral, não contam com políticas
integradoras.
Com vinte metrópoles e duas megacidades, onde mora quase
metade da população, nosso país precisa rever essa dimensão político-institucional
e de gestão das grandes aglomerações, núcleo estratégico do desenvolvimento
nacional. Conhecimento e inovação, binômio que está na base da economia neste
século 21, são essencialmente urbanos.
Sabemos que nossas cidades constituem nosso mais amplo e
abrangente patrimônio sócio-cultural. Contudo, também conformam um passivo
sócio-ambiental que é preciso enfrentar com determinação, recursos e
planejamento –indispensáveis para alcançarmos uma qualidade urbana compatível
com a democracia e com as exigências contemporâneas. A política precisa estar
associada ao espaço.
Estamos pregando no vazio. Fazer o quê?
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