segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Mais rico e com mais dinheiro?

Sérgio Magalhães

Há poucos dias fiz um comentário comparando os PIBs dos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro. Mostrei que a relação entre PIB/Área é maior no RJ do que em SP. Terminei assim a nota: “Fosse pela economia, as estradas do RJ teriam que ser melhores, os equipamentos, as infra-estruturas. Assim, deve haver outra explicação para a diferença entre qualidades...”

Continuei a pesquisar, para ver se decifrava o enigma: se a “densidade econômica” do RJ é mais alta do a de SP, por que a diferença entre a qualidade das infra-estruturas estaduais? Os recursos dos governos estaduais são proporcionais às respectivas economias? Ou será que o governo fluminense tem proporcionalmente menor orçamento do que o paulista?

As perguntas me pareceram pertinentes, porque não é o PIB que constrói e mantém as infra-estruturas, os equipamentos, os serviços públicos. É o governo, através de seus recursos financeiros, traduzidos pelo Orçamento.

Foi aí que fiquei mais perplexo: o estado do Rio de Janeiro tem maior “densidade orçamentária” do que o estado de São Paulo. Isto é, o RJ tem mais recursos orçamentários por km² do que SP.

Procurei a economista Sol Garson, ex-secretária de Fazenda, para me ajudar a conferir. Pelos dados do Ministério da Fazenda, para 2008, a receita de SP foi de 103 bilhões de reais enquanto a do RJ foi de 40 bilhões. Comparados pela área de cada estado, SP tem orçamento de R$ 415mil / km² enquanto o RJ tem R$ 917mil / km².

E como as despesas são muito próximas das receitas, podemos dizer que a média de gastos por km² no RJ é 2,2 vezes maior do que em SP.

Estudo semelhante para outros estados, indica posição privilegiada do Rio: sua “densidade orçamentária” é 9 vezes maior do que a do Paraná, 12 vezes maior do a do Rio Grande do Sul e 15 vezes maior do que a de Minas Gerais.

Proporcionalmente ao tamanho do território a ser mantido, o estado do Rio é o mais rico e tem o governo com mais dinheiro, entre todos os estados brasileiros.

E agora?

Veja a tabela com os dados completos

sábado, 29 de agosto de 2009

100 Anos de Burle Marx (II)

Eduardo Cotrim
Vem em bom momento a criação do Grupo de Trabalho, que reúne Prefeitura do Rio e IPHAN, para elaborar o Plano Diretor do Parque do Flamengo. Esse GT está contido num outro maior, que estuda diretrizes para mais duas áreas emblemáticas da cidade - a Orla de Copacabana.e a Floresta da Tijuca. No horizonte, a candidatura do Rio à Cidade Patrimônio Mundial, na categoria (peso-pesado) paisagens culturais. A candidatura se oficializa ainda este ano, com envio do dossiê à UNESCO. A decisão quanto à ratificação será em 2010.

Portanto, Parque do Flamengo, Orla de Copacabana e Floresta da Tijuca são o universo com o qual se trabalha a candidatura. E não seria muito acrescentar que, mesmo na Floresta da Tijuca, encontrem-se as mãos de Burle Marx, nos jardins da Capela Mayrink.

Parece estar subentendido pela PCRJ e IPHAN, e isso é positivo, que a formulação de diretrizes não deva se restringir à expectativa da candidatura ao título da UNESCO, ainda que, por si, o processo seja um excelente estímulo para um engajamento coletivo, que alimente a percepção do valor da paisagem urbana do Rio e por conseqüência, sua preservação.
Referindo-me apenas ao Parque do Flamengo, parece ter um viés muito específico: o de consolidar a titulação do legado paisagístico de Burle Marx, para nós mesmos, sejamos cidadãos cariocas ou visitantes.

O Parque do Flamengo extrapolou fronteiras, justo pela originalidade de sua concepção paisagística. Por isso, tem lugar definitivo na história da luta silenciosa entre os modelos de tratamento de espaços, observada no artigo anterior. Re- ouvir melhor a potencialidade paisagística do Parque é provavelmente o que faria hoje seu criador, pois nas palavras de Lucio Costa, “Roberto Burle Marx é simplesmente um compositor de velha estirpe que se expressa por outra via – a visual”.

E já que é assim, que nos apropriemos mais do Parque e ouçamos melhor todas suas potencialidades.

Centro e Centralidades

Sérgio Magalhães

O Centro do Rio é também o Centro Metropolitano. Tanto funcionalmente como simbolicamente, detém as principais centralidades do estado e ainda preserva parte importante de centralidades nacionais, construídas ao tempo em que a cidade foi capital federal. Sua estrutura urbanística é poderosa.


A reforma de 1903-1906, mandato do prefeito Pereira Passos, consolidou espacialmente um conjunto de atributos formais, funcionais e simbólicos que não apenas modernizaram o Rio como o transformaram na Cidade Maravilhosa. Intervenções nas décadas seguintes, como o desmonte do morro do Castelo e a urbanização da Esplanada, o desmonte do morro de Santo Antonio, a construção da Avenida Presidente Vargas e o Aterro do Flamengo, foram ações urbanísticas de larguíssimo alcance. Sobretudo evidenciaram a capacidade do Rio em estruturar-se como uma grande cidade, de estatura mundial.


Mas a energia potencial desse esforço está a exigir um recarregamento.

Por isso, precisamos saudar o desejo de desenvolvimento da área portuária do Rio, anunciado pelo prefeito Eduardo Paes. Esse desejo pode ser um instrumento importante para uma nova fase de reforço da centralidade do Centro.


Afinal, nas últimas décadas, a cidade desmobilizou-se em benefício de novas áreas, como a Barra da Tijuca, que capturou recursos vitais para o desenvolvimento urbano. A situação de dificuldades hoje vividas pelo Centro e pela Zona Norte suburbana é, em grande medida, resultado desse rumo concentrador e equivocado.

domingo, 23 de agosto de 2009

Maria Alice no Cidade Inteira

Sérgio Magalhães
Há alguns meses, um grupo de amigos nos reunimos para ouvir a socióloga e professora Maria Alice Rezende de Carvalho, cujo tema central foi a cidade.
Foi uma noite memorável, no Cosme Velho, casa do Flávio e Helô Ferreira, em que também participaram Ceça Guimaraens, André Luiz Pinto, Luiz Flórido e eu.
O Lucas Franco retirou do vídeo algumas passagens dos comentários de Maria Alice:
- no trecho Reinventar o Rio, MA defende a necessidade de construirmos um novo consenso para uma agenda para a cidade, tal como, segundo ela, foi possível nos anos oitenta em torno da igualdade.

-no trecho Coletivos, Maria Alice faz uma reflexão sobre a construção de uma cidade em que o coletivo seja a base do acordo social, ao invés do indivíduo, que teria sido a base do acordo já esgotado.

- no trecho Escola Pública, MA comenta o papel político que a escola pública desempenhou na intermediação social.

Imperdíveis!

No YouTube:
01-Reinventar o Rio (3'57'')
02-Coletivos (1'31'')
03-Escola Pública (1'14'')

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

100 anos de Burle Marx

Eduardo Cotrim
Desde o Paraíso bíblico da Gênesis, onde “Deus tinha produzido da terra toda a casta de árvores formosas à vista”, a humanidade tem edificado jardins, e assim, com o passar dos tempos e de outros grandes artistas, chega-se a Burle Marx.

A história que conhecemos muitos de nós, do Paisagista, já é o bastante para qualquer mortal, como a sua obra, que está, aí, pela cidade, pelo Brasil e mundo afora, disponível a todos.

O Rio, lugar onde se radicaram os pais de Burle Marx, tem sido, historicamente, a vitrine de célebres paisagistas: o brasileiro Mestre Valentim, do Passeio Público e do Chafariz da Pirâmide da Praça XV, ainda do Vice-Reinado, o francês Glaziou, da Quinta da Boa Vista e do Campo de Santana do segundo reinado, como o inglês John Tyndale, do atual Parque Lage. Paul Villon, dos jardins da Casa de Rui Barbosa e do Palácio Guanabara. Quantos seriam os eméritos paisagistas pré-Burle Marx, que, em suas passagens e permanências, construíram para sempre a identidade do Rio em suas ruas, praças, parques e florestas? Eram outros tempos - mesmo que estes incluam ainda os mais recentes - quando as estéticas romântica e clássica européias, marcavam, inevitavelmente, todos esses artistas.

O fato é que ao nos depararmos com o Parque do Flamengo, com os calçadões de Copacabana, com os jardins do Palácio Copanema, para não sairmos do Rio e divagarmos pela pintura, cerâmica, artesanato.... não seria estranho tratar o Paisagismo, como algo anterior e posterior a Burle Marx. Além disso, quem sabe, a história do paisagismo, sob uma observação da ótica burle-marxiana, não possa ser concebida como a história da luta entre arranjos de espaços?

E quanto aos terraços-jardins da contemporaneidade ecológica internacional, tão alardeados como uma nova invenção? Perguntemos a Roberto Burle-Marx !

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Cabe no bolso

Sérgio Magalhães
A excelente série de reportagens que O Globo publica desde o último domingo, Democracia nas favelas, culmina hoje com um cálculo surpreendente: a retomada definitiva de todos os territórios hoje sob o controle de bandidos poderá custar apenas 0,4% do orçamento do estado. Ou algo como um milésimo do PIB do Rio de Janeiro.

Em outra nota, neste blog, comentei a relação entre PIB e área do estado. No cálculo que fiz, nossa “densidade economica”é quase o dobro da densidade econômica de SP.

Se outras razões fundamentais não pudessem sustentar o combate à violência, agora, com a demonstração de que uma política de retomada e permanência dos serviços públicos de segurança em toda a cidade é perfeitamente viável, acho que já podemos compartilhar uma fundamentada esperança.

Já vai ser possível voltar a sonhar com uma Zona Norte que se desenvolva; com um Rio Metropolitano; com uma cidade inteira!

Sem dúvida, a cada passo, a cada progresso, devemos comemorar.

O Globo: Uma virada que cabe no bolso: UPPs em todas as favlas, em média, um miléssimo do PIB carioca

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Densidade econômica e infra-estrutura: SP x RJ

Sérgio Magalhães
É senso comum: quanto mais desenvolvida for a economia, melhor a qualidade de vida.
São Paulo tem a maior economia entre todos os estados brasileiros; tem as melhores estradas; as cidades médias são desenvolvidas, com bons equipamentos comunitários; a qualidade de vida é de bom nível.
O Rio de Janeiro tem um sistema viário muito inferior ao paulista, cidades menos equipadas, sem adequada infra-estrutura. O saneamento é precaríssimo.
Pudera: a economia paulista é 3 vezes maior do que a fluminense: o PIB de SP alcança R$ 850 bilhões enquanto o PIB do RJ é R$ 290 bilhões.
Está explicado? Não.
Ocorre que a área do estado paulista é quase 6 vezes maior do que a do estado fluminense. A densidade econômica (PIB / Área) do Rio é quase o dobro da de São Paulo: RJ produz R$ 6,6 milhões por Km2 ; enquanto SP produz R$ 3,4 milhões/km2.
Fosse pela economia, as estradas do RJ teriam que ser melhores, os equipamentos, as infra-estruturas. Assim, deve haver outra explicação para a diferença entre qualidades...

domingo, 2 de agosto de 2009

Política e a Câmara na Cinelândia

Sérgio Magalhães
Por razões que os cientistas políticos haverão de saber, nós estamos acostumados a creditar aos políticos a responsabilidade pela resolução dos problemas de todas as naturezas. Contudo, a política –aquela das instituições de representação- não está respondendo à complexidade da sociedade contemporânea. Enquanto isso, os problemas se avolumam.
Olha só o caso da Câmara de Vereadores do Rio.
Quando Pereira Passos fez sua grande obra de remodelação do Rio, a Avenida Central foi a espinha dorsal da mudança. Em um dos extremos da Avenida, implantou a representação da centralidade comercial/econômica, a Praça Mauá; na outra, implantou-se a representação política e cultural, a Cinelândia. Desde logo, com o Teatro Municipal, a Biblioteca Nacional, o Museu Nacional de Belas Artes; com o Clube Naval e o Clube Militar; e com o Senado. Instalada em prédio construído sob encomenda, na década de 1920, a Câmara ajudou a consolidar a Cinelândia como locus privilegiado da política carioca.
Quase a totalidade dos principais eventos políticos de massa realizados no Rio de Janeiro têm a Cinelândia como foco. E, no dia a dia, é onde se reúnem manifestantes de todas as greis e temas. Talvez seja o lugar político mais vivo da cidade.

Mas, agora, a Câmara decide se mudar da Cinelândia. Alega que não há condições adequadas para o seu trabalho nos imóveis que lhe estão disponíveis. Precisa de prédio novo, maior.

A mudança não será saudável. Para a cidade e para a política.

Para a política, porque privilegia os aspectos administrativos-burocráticos da instituição, a ponto tal que passam a se impor ao simbólico-representativo. A ser verdadeira essa alegada necessidade, que paralelo se faria com o Parlamento britânico, pai da democracia moderna, há séculos ‘estabilizado’no mesmo edifício? Que inveja ver ao vivo, pela TV, o debate entre o Primeiro Ministro e os deputados, frente a frente, em um salão de proporções modestas e austeras! (A burocracia, por certo, está lá; mas não é ela que protagoniza a política.)

A Câmara pretende ir para um terreno próximo do porto. Acha que assim ajudará a revitalizar a área portuária. Contudo, a mudança não será saudável para cidade porque enfraquece o seu principal espaço público, aquele que sediou a representação nacional por décadas, e que continua no imaginário coletivo como o lugar da política. Não faz sentido buscar-se a revitalização do Centro e trabalhar no sentido da desconstrução da sua centralidade histórica e política.
Quem, quem quer que seja, por mesquinharia, demoliu nos anos de ditadura o Palácio Monroe, sede do Senado, estará agora justificado com a ‘derrubada’ da Câmara, nos anos de democracia...
Com urgência uma agenda para a nossa cidade!

veja também: http://www.almacarioca.com.br/cinel.htm

Consenso e agenda

Sérgio Magalhães
Há poucos dias participei de uma mesa-redonda no XIV Congresso Brasileiro de Sociologia. Coordenada pela professora Maria Alice Rezende de Carvalho, contou com a presença dos professores Beatriz Jaguaribe e Gilberto Velho, além de mim.
O tema, é claro, foi a cidade.
Para a coordenadora, os discursos se complementaram de tal modo que pareceriam ter sido combinados. Mas, de fato, a ‘combinação’ resulta do amadurecimento que a reflexão sobre a cidade já alcança entre tantas parcelas sociais, acadêmicas e políticas. Há amadurecimento, todavia falta um desdobramento na construção de uma agenda.
Penso que já há condições para que se busque um certo consenso mínimo em relação ao enfrentamento dos problemas urbanos mais gritantes –ou, pelo menos, para aqueles para os quais se possa vislumbrar o equacionamento.
Uma agenda que contenha um compromisso com o transporte público, como a transformação dos trens suburbanos em metrô, ou como o fortalecimento do centro –para não falar apenas no combate à violência.