segunda-feira, 27 de maio de 2013

Inimputáveis?


Sérgio Magalhães

*Artigo publicado originalmente no jornal O Globo de 25/05/2013                                   
Acidentes que se multiplicam, veículos com centenas de infrações, multas não pagas, carros sem conforto – são tantas as queixas sobre os ônibus que é justo indagar: eles são inatingíveis? Cobrado a respeito, diz o presidente da Federação das Empresas de Transporte: “O Rio cresceu sem planejamento.”
As cidades modernas, resultantes da industrialização, tornaram-se grandes cidades quando o sistema de transporte coletivo foi capaz de transportar amplos contingentes. Elas se apoiaram no transporte rápido, nem sempre subterrâneo, em geral sobre trilhos. Londres inaugurou o metrô nos anos 1860; Paris, em 1900.
Ao contrário do que se diz, o Rio cresceu bem estruturado - pelo transporte e obedecendo à geografia. Quando a cidade precisou se expandir para além da área que hoje chamamos por Centro, ela o fez apoiada pelos trilhos. Na Zona Norte, ampla e larga, ainda no século XIX construiu as linhas ferroviárias suburbanas. Na Zona Sul, área restrita, foram os bondes que orientaram o crescimento. Os bondes ainda interligavam as ferrovias, em delicados percursos. Era uma boa estrutura.
Mas, nos anos 1960, as cidades brasileiras foram levadas a desmobilizar o modo sobre trilhos, adotando o modo rodoviário (implantava-se a indústria automobilística). Para o Rio, cidade então mais bem estruturada do país, urbanisticamente, foi uma hecatombe. Não modernizou os trens, que se degradaram, e fez um metrô peculiar: isolado das ferrovias, uma só linha, ao invés de uma rede. Apostou no ônibus e no carro. Nem o ônibus é adequado para grandes percursos, nem o carro o é para grandes contingentes. Assim, entre as cidades brasileiras, no Rio é maior a percentagem de pessoas que gastam de 1h a 2h na viagem casa-trabalho (ANTP, 2011).
A cidade teve muitos de seus melhores espaços públicos desqualificados pela invasão rodoviarista, no Centro, na orla, nos bairros. A dupla automóvel-ônibus é gulosa por território; quando imposta hegemonicamente a tecido urbano preexistente, rompe a escala dos lugares, inibe a relação cidadão-cidade, exclui alternativas de mobilidade.
Não, o Rio não cresceu sem planejamento. A cidade teve imposta uma troca modal em desacordo com sua estrutura. Está em tempo de reconhecer o erro (a indústria automobilística já é forte...). O rodoviarismo ainda pressiona para transformar todo tecido urbano em área de passagem.
O Rio precisa redesenhar sua mobilidade em sintonia com suas estruturas urbanísticas. Onde a urbanização é estruturada pelo automóvel, como na Barra, adequando-se a esse modal; mas, no sistema metropolitano e na Zona Norte-Zona Sul-Centro, dando ênfase a modos de alto rendimento, tipo metrô em rede e transformação dos trens em metrô.
A indefinição político-institucional da cidade metropolitana certamente responde pela ausência de respostas. É inércia que há décadas penaliza a população.
Todos os modos de transporte têm o seu lugar. Mas não é por reconhecermos sua óbvia inadequação como principal modo de transporte da metrópole que os ônibus se tornam inimputáveis.
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A propósito: Há melhor sintonia com a estrutura do bairro que o bondinho em Sta. Teresa? Quando voltará?

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