Sérgio Magalhães
*Artigo publicado originalmente no jornal O Globo de 08/12/2012
Por
que obras públicas essenciais são postergadas e supérfluas são implantadas com
sofreguidão? Por que a cada hora surgem saídas modernosas de metrô, passarelas
monumentosas, píers em Y, entre outras intervenções que comprometem a imagem
ambiental de nossas cidades? Por que planejar Brasília a partir de Cingapura
–uma ideia de jerico?
Nestas
últimas décadas, o desenvolvimento sócio-economico do país está sendo feito com
o fortalecimento de suas instituições, agora democráticas, e com grande
interesse e participação da sociedade. Porém, não é o mesmo o que ocorre no
caso urbano. Aqui, há uma clara des-institucionalização da ideia de
planejamento, de projeto e de prioridade.
Com
o espetacular crescimento ao longo do século XX, nossas cidades se tornaram
muito complexas. Ficou difícil ao cidadão compreender a escala de uma grande
cidade. Questões que interferem diretamente na vida das pessoas, como a
mobilidade, o saneamento e a segurança, se apresentam tão embaralhadas que ao
senso comum parecem insolúveis.
Não
são insolúveis, porém. Há respostas adequadas ao tamanho da grande cidade, mas,
certamente, não serão imediatas, ao alcance de um desejo. É preciso estudar,
planejar, projetar; é preciso tempo e continuidade na decisão. É preciso
debater. Não há varinha de condão que substitua processo continuado de
enfrentamento de cada questão.
Contudo,
há de se reconhecer que muitas cidades desconstruíram seus incipientes
organismos de planejamento, seja urbano ou metropolitano, como se deu no Rio.
Instituições de pesquisa e estudos urbanos, sem renovação, são relegadas à
burocracia ou extintas.
Assim,
as cidades continuam a implementar respostas já superadas, como os
investimentos que privilegiam o transporte rodoviário –embora já se saiba que a
mobilidade não melhora com mais pistas. Sem planos, a interlocução com o
mercado imobiliário assume papel hegemônico nos órgãos urbanísticos e de
controle das principais cidades brasileiras –mas a maior parte das moradias é
construída à margem da regulação.
Sem projetos –tudo é emergencial. Tudo assume caráter prioritário,
inclusive as obras supérfluas e de custo exagerado.
Construir
a cidade do século XXI é enfrentar o passivo ambiental, sanear os rios,
universalizar os serviços públicos, inclusive o de segurança, conter a expansão
especulativa da área ocupada, qualificar o espaço público.
Mas
será preciso construir instituições urbanísticas e de planejamento estáveis,
que sejam consideradas para além dos governos, abertas ao diálogo com a
sociedade. Dá trabalho e reduz o poder discricionário dos governantes –mas
melhorará os seus governos. Certamente, evitará arroubos modernosos,
monumentosos –ou atentados, como o caso Brasília by Cingapura. Como desconhecer que a cultura não é objeto
supérfluo, mas elemento central da soberania de um povo?
A
democracia política veio para ficar. Ela há de conduzir à democratização das
cidades. Não custa dar uma ajudinha.