terça-feira, 17 de abril de 2012

Sobre fechar varandas

Balcões em balanço e varandas embutidas: fechamento com esquadrias modifica a volumetria original, Rio de Janeiro, década de 1940
Andrea Redondo*

O fechamento de varandas, objeto de proposta que tramita na Câmara de Vereadores, é mais complexo do que parece. Há que explicar.

Previstas na legislação urbanística da cidade pelo menos desde 1937, desde 1975 as varandas são um bônus previsto em lei. Para usufruí-lo, entretanto, há uma obrigação a cumprir: as varandas devem ser abertas e em balanço, isto é, providas apenas de guarda-corpo e sem pilares de sustentação.

Por bônus ou benefício, entenda-se que as varandas não são contadas na área máxima de construção nem na taxa de ocupação previstos para cada terreno. Por hipótese, em lote de 500m² onde se pode ocupar 70%, o andar padrão terá 350m², e mais cerca de 60m² de varandas balanceadas. Caso sejam projetadas varandas fechadas prevalecerá o limite inicial.

Aparentemente o benefício é vantajoso para construtor e morador. Todos querem as varandas, chamariz do mercado imobiliário e objeto de desejo há décadas. Não há desinformação de nenhuma parte: a restrição quanto ao fechamento está gravada nos projetos aprovados, nas Convenções de Condomínio, e consta no Registro de Imóveis.

A vantagem não se restringe a ganhar metros quadrados. Os espaços que existem em volta dos prédios necessários para ventilar e iluminar os cômodos devem ser obrigatoriamente livres, bem como as distâncias mínimas das fachadas às calçadas. As varandas, uma exceção, podem ocupar os espaços mínimos para ventilar e iluminar as moradias, e fronteiros à rua, todos, na origem, non-aedificandi. O legislador considerou que, sendo abertos, os volumes poderiam ser projetados para fora das fachadas, sem prejudicar as condições de aeração e insolação de salas, quartos, banheiros e cozinhas, ou a vizinhança.

Portanto, o fechamento desse tipo de varanda é indevido tanto do ponto de vista legal quanto conceitual e técnico: contraria o Código de Obras e afeta condições de salubridade dos cômodos prevista nas normas, e diz respeito não apenas a cada apartamento, mas aos edifícios, aos vizinhos. Afeta a quadra e importa à cidade como um todo.

Não obstante esses aspectos, de tempos em tempos e mediante pagamento ao Município a chamada “lei da mais valia” regulariza os fechamentos proibidos, procedimento no mínimo incoerente por legalizar o que não pode ser licenciado.

Surge agora o citado Projeto de Lei para permitir o fechamento das varandas que são construídas obrigatoriamente abertas, cuja ementa por si é questionável: destina-se a “possibilitar a proteção contra intempéries”. Além disso, o material tem que ser incolor e translúcido, sem necessidade de padronização. Poderá haver esquadrias, embora não explique como se farão invisíveis... Mais estranho ainda, não será permitido na Zona Sul, sem determinar que as intempéries sejam proibidas nessa região do Rio de Janeiro.

Há mais. O fechamento não poderá resultar em aumento real da área da unidade residencial nem será permitida a incorporação da varanda aos compartimentos internos, sob pena de multa. Ora, as três afirmações são inócuas: as duas primeiras são inerentes ao fechamento. A terceira é inaplicável, pois obras internas em residências são isentas de licença e fiscalização.

O que se pretende de fato é modificar a lei para liberar o fechamento das varandas - que nasceram na condição de serem abertas – e o caríssimo pagamento da “mais valia”. Sem entrar no mérito da última, a proposta é mais um equívoco da legislação urbanística carioca, diante das condições especiais em que as varandas têm sido construídas até aqui.

Se por algum motivo as normas devem ser mudadas, que o seja para prédios novos, onde a faixa frontal à calçada e os espaços para ar e luz, deverão permanecer livres. Para os prédios existentes, bambinelas translúcidas resolverão a alegada questão das intempéries.

*Andréa Albuquerque Garcia Redondo é arquiteta (FAU UFRJ, 1975), com pós-graduação em Urbanismo (FAU UFRJ, 1990) e em Governo e Administração Municipal pela Escola Nacional de Serviços Urbanos – ENSUR (Instituto Brasileiro de Administração Municipal – IBAM, 1992)

Um comentário:

  1. Quem deve decidir se o ambiente fica ou não ventilado ou iluminado é o proprietário. As persianas de vidro dão um visual bem moderno aos prédios e permitem a proteção da área. Vou torcer para que aprovem.

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